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segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Loucura




Era mais um dia de fevereiro, quente, sufocante. De toda parte ouvem-se trovões e chuvas torrenciais prendendo a todos. Por sorte cheguei em casa a tempo, antes que desabasse o céu inundando e afogando o Rio de Janeiro. 

Mila, minha gatinha, veio saldar-me, como a amava! Não saberia o que fazer  sem essa bolinha de pelos carinhosa me afagando, e afastando as tristezas. Servi sua ração predileta, bebi um refrigerante pra aliviar o calor...como estava quente! Podia ouvir o cataclismo lá fora, as janelas tremulavam com a força do vento e na sala haviam algumas poças d'água vindas das persianas.

- Mas que droga! Meu piso de madeira vai manchar... já falei para o síndico e nada de solução! (pensei)

Fui  à cozinha, peguei um pano e ajoelhei-me para secar o piso, quando uma fagulha vinda da tomada na parede, úmida pelos respingos, atingiu meus olhos ferindo-me terrivelmente. Foram segundos de dor e terror inimagínaveis!

- Oh meu Deus! Meus olhos...não posso ver! Socorro!!!  (gritei desesperada)

Alguém grita no corredor do prédio e ouvi o pânico em sua voz:

- Apagão! Todos para casa ou fiquem no Hall. Vocês no elevador! Não se preocupem, vamos tirá-los em breve!

O tumulto de vozes começava a afastar-se e comecei a apavorar-me. Precisava de socorro ou ficaria cega. Com dores alucinantes, levantei-me insegura e ensaiei alguns passos, tateando na escuridão, não sabia onde estava, mas precisava chegar à porta e sair dali! Andei cautelosa, sangue escorria pelos cantos de meus olhos, tateava o ar buscando uma referência, quando de repente, algo prende entre meus tornozelos e caio violentamente no chão.

Entre golfadas de sangue, urrando de dor e desespero segurava agora, a língua que fora cortada com os dentes na queda. Contorcia-me sem saber o que fazer, pra onde ir, sem ter como pedir ajuda. Rastejei e encontrei o sofá, mas não tinha forças para subir e deitar-me nele, fiquei caída no chão na poça de meu próprio sangue. Desmaiei e assim fiquei por muito tempo...

Acordei e tentei pedir ajuda mas não conseguia pronunciar palavras com a língua decepada e praticamente cega. Medo, fome, sede...tudo tão desesperador, quero morrer, mas como? Ninguém me socorreria, morreria de fome, cega e deitada naquela nojenta poça de sangue e fezes. 
De súbito, sinto algo macio acariciar meu rosto. Uma pequena língua "beijava" meu rosto úmido de lágrimas incandescentes, Mila que me derrubara acidentalmente, tentava me consolar como sempre fizera. Chorei ainda mais, correndo os dedos em seu pelo macio, senti seu calor e não resisti, cravei os dentes naquele pequeno e frágil pescoçinho.
Mila lutou, arranhou e miou desesperada, mas eu faminta, venci seu esforço em livrar-se. Bebi seu sangue quente e devorei sua carne macia e como era bom! A fome se acabou e restou pouco de Mila. Aterrorizada com o que fiz, desisti de viver e deitei-me, esperando a morte e o inferno por meu ato quando um estrondo chama minha atenção. Alguém arrombou a porta de meu apartamento, pude ouvir os gritos de horror e nojo pelo odor fétido e pela cena horripilante encontrada.

Fui levada para o hospital e fiquei internada por cinco meses afim de recuperar a visão, mas não obtive sucesso, apenas 20% dela retornou.
Ao deixar o hospital, segui as orientações médicas e até frequentei um grupo de ajuda, mas não me sentia a mesma, desde o ocorrido tinha uma sensação de vazio e fome que nada saciava, estava vivendo um verdadeiro inferno!

À tarde resolvi passear pelo parque para esquecer desejos ainda desconhecidos, quando um cheiro me faz parar. Minha cabeça vibrou como um sino, o estômago ronca esfomeado, necessito descobrir o que é e ao procurar ansiosamente a fonte de meu desejo, fome e tranquilidade, encontro uma garotinha que segurava em seus braços um gatinho. Me aproximei e minha boca se encheu d'água. Que havia comigo?! Eu precisava daquele gato e então arranquei-o dos braços da menina e fugi o mais rápido que pude. Encontrei um vão sob a ponte do riacho e devorei o gatinho ferozmente! O sangue quente escorrendo por minha garganta, a carne macia e deliciosa...Ah! Finalmente encontrei repouso, paz e saciedade à famigerada fome que me dominava, agora só me restava o Inferno para a conciência culpada ou o manicômio para a mente alucinada.



Ariadne

2 comentários:

  1. Olá!! meu nome é Selene D'Aquitaine! Sou autora e gostaria de fazer parceria com blog Fragmentos Sombrios. Também participo do grupo "O Santuário dos Poetas Mortos" no facebook. =D

    http://selenedaquitaine.blogspot.com

    @escritoraselee

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    1. Oi Selène,

      Grande prazer em ter parceria contigo! Já está adicionada à minha lista de parceiros!

      Beijo Imortal e sucesso sempre!

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